Produtividade

Mark Twain e a criatividade

“Você não precisa acertar o seu livro na primeira vez. Esforce-se e reinvente ou reescreva-o. Só Deus exibe seu trovão e raio com intervalos, e por isso eles sempre chamam atenção. Estes são os adjetivos de Deus.” – Mark Twain em uma carta de 1878.

Samuel Langhorne Clemens foi muitas coisas: um piloto de um barco a vapor, um prospector, um repórter, um viajante do mundo, um palestrante, um investidor (e bem ruim por sinal), inventor (com três patentes; duas bem sucedidas e uma não), um pai e mais importante, o autor conhecido como Mark Twain.

Ele não foi nem organizado, nem aplicado.

Isso não significa que não fosse prolífico; ele produzia romances, ensaios, peças, críticas e cartas aos montes. Ele só não era um escravo do trabalho.

Bata Enquanto o Ferro Está Quente

Alex Applebaum, em uma crítica da obra Mark Twain at Work, de 1942, escrita por Bernard DeVoto, notou nos hábitos de trabalho de Twain que:

Twain trabalhava “esporadicamente” dependendo de surtos de “inspiração”. Em vez de se forçar a trabalhar por um certo período de tempo, [ele] confiava principalmente na “improvisação” e às vezes trabalhava furiosamente durante dias; às vezes sem nem escrever, às vezes começando projetos e deixando-os inacabados durante anos; às vezes concluindo-os rapidamente … Ele não terminava quase nada do que começava, mas mesmo assim, escrevia prolificamente. Ainda há milhares de páginas não publicadas e ideias que ele nunca deu prosseguimento.

O que podemos aprender com isso? Escrever e escrever e escrever mais um pouco – quando a inspiração bater. Tome nota de tudo. Não se censure. Até mesmo se uma ideia parece inútil agora, ela pode muito bem se tornar algo valioso mais tarde. Mantenha diários, notas ou até um blog. Mesmo se uma ideia não levar a lugar nenhum por conta própria, ela pode dar a faísca necessária para algo que leve. O único erro seria não deixar sua criatividade nativa se expressar na hora certa.

O Que Funciona Melhor é o Que é Certo Para Você

Apesar de haver de fato momentos em que queremos escrever ou comunicar nossas ideias com um objetivo ou projeto específico em mente, não deixe um resultado específico lhe atrapalhar. A abordagem de Twain nesse aspecto foi ressaltada quando a edição revisada de sua autobiografia foi publicada em 2010. Robert H. Hirst, o Editor Geral do Mark Twain Project e o Curador dos Trabalhos de Mark Twain na Universidade da Califórnia em Berkeley, contou a David Bianculli da NPR que:

Twain … “achou a forma certa de fazer uma autobiografia” … O que ele descobriu … foi a arte do ditado. Em vez de escrever sua autobiografia, Twain queria contar histórias para outro ser humano. E, em vez de contar sua história de vida em ordem cronológica, Twain queria falar sobre o que o interessava naquele momento — e se permitir mudar de assunto assim que o seu interesse sinalizasse.

Twain ditou a maior parte dessa autobiografia em sua cama. Em 1905, ele contou a A.E. Thomas do New York Times:

“Sempre que eu tenho trabalho a ser feito, vou para cama. Peguei esse hábito há algum tempo quando tive um ataque de bronquite… Gostei tanto que continuei depois de melhorar. Há muitas desvantagens nesse processo. Se você está em uma escrivaninha, fica animado com o que está fazendo e logo logo… alguém entra para cuidar da lareira, interrompe você e te tira do caminho da ideia que você está perseguindo. Então vou para cama… Trabalhar na cama é um ótimo evangelho—pelo menos pra um homem que chegou, assim como eu, ao ponto da vida em que seu sangue congela facilmente.”

Apesar dos métodos de “trabalho” de Twain parecerem um tanto antitéticos em termos de produtividade e serem únicos a ele (quantos de nós conseguem executar nossas tarefas diárias em uma cama confortável ou ditar nossos pensamentos para um estenógrafo conveniente?), há lições que podemos aprender delas. Há muito que pode ser dito sobre permitir que a criatividade de alguém flua livremente sem inibições; escrever alguma coisa em uma página ou contribuir para um projeto. Você sempre pode desenvolver e editar ideias, mas a faísca inicial de criatividade nunca deve ser negada. Estas ideias podem ficar em repouso durante meses (ou até mesmo anos), mas elas existem e você pode expandi-las mais tarde quando estiver pronto.

Muito Trabalho e Nenhuma Diversão …

Talvez o desdenho de Twain pelos métodos tradicionais de trabalho tem a ver com o fato que ele não considerava o que fazia como “trabalho”. Na mesma entrevista para o Times, ele contou a Thomas que nunca havia

“… trabalhado um dia sequer na minha vida. O que fiz, fiz por ser diversão. Se fosse trabalho, provavelmente não teria feito.

Quem foi que disse, ‘Que seja abençoado o homem que encontrou seu trabalho?’ Quem quer que tenha sido, tinha a ideia certa na cabeça… Quando falamos sobre os grandes trabalhadores do mundo, realmente queremos dizer os grandes desfrutadores do mundo. Os caras que reclamam e suam sob o pesado jugo do trabalho que suportam nunca podem querer fazer nada muito grande.”

Ele expôs esse pensamento no seu romance de 1889, A Connecticut Yankee in King Arthur’s Court (que ridicularizava ferozmente o capitalismo e a “Era Dourada” dos plutocratas que estava próxima) ao fazer seu protagonista substituto dizer:

“O ‘trabalho’ intelectual não deveria ser chamado assim; é um prazer, uma dissipação e sua própria recompensa mais alta. O arquiteto, engenheiro, general, autor, escultor, pintor, professor, advogado, legislador, ator, pregador, cantor mais pobre está construtivamente no paraíso enquanto trabalha; e o mágico com o arco do violino em sua mão que senta no meio de uma grande orquestra com as marés baixas e altas do som divino caindo sobre ele—porque certamente, ele está trabalhando, se você deseja chamar isso, mas meu Deus, é um sarcasmo da mesma forma. A lei do trabalho de fato parece bem injusta—mas está aí, e nada pode mudá-la: quanto mais o trabalhador desfrutar do trabalho, maior deve ser seu pagamento em dinheiro também.”

Hoje em dia, muitos de nós ficamos tão presos em nossos trabalhos diários (que podem, admitimos, serem penosos) que não nos permitimos parar um tempo para pensar, refletir e desfrutar da liberdade de nos expressarmos e preservarmos nossas observações e ideias. A noção de verdadeiramente sentar em frente a um teclado—ou, pior, de fato colocar uma caneta no papel!—pode parecer dever de casa ou uma tarefa. Mas quantas vezes temos a chance de estar conosco e nos comprometermos ao que realmente pensamos e sentimos de maneira permanente? É claro, criar um tweet conciso ou um status de Facebook vago é legal, mas como é melhor nos darmos a liberdade de realmente vasculhar e examinar uma ideia ou um conceito por nós mesmos? Não é como se outra pessoa tivesse que ver ou ler o que fizemos; a mera chance de pensar e escrever sobre uma ideia desenvolve músculos criativos que podem ser úteis quando realmente precisamos deles ou quando algo deve ser expresso publicamente.

Não existem ideias originais

Duplicar e usar os métodos de Twain seria honrar o homem que expressou a ideia de que não havia ideias originais; apenas empréstimos e expansões do trabalho e das ideias de outros. Em 1892, a autora e humanitária Helen Keller foi acusada (e absolvida) de plágio. Após ler sobre o caso na própria autobiografia de Keller, Twain se sentiu movido a escrever para ela, dizendo:

“Ó céus, como impensavelmente engraçada e comicamente idiótica e grotesca foi aquela farsa do “plágio”! Como se houvesse muita coisa em qualquer iteração humana, seja ela verbal ou escrita, que não seja plágio! O núcleo, a alma—vamos além e dizer que a substância, o volume, a material verdadeiro e valioso de todas as iterações humanas—é plágio. … É necessário mil homens para inventar um telégrafo, ou um motor a vapor, ou um fonógrafo, ou um telefone ou qualquer outra coisa importante—e o último homem ganha o crédito e esquecemos dos outros. Pensando nisso, é quase que nossa incumbência nos expor ao máximo de conhecimento e inspiração que pudermos encontrar de qualquer fonte para sintetizá-la e, ironicamente, transformá-la em algo nosso. Leia tudo que puder. Escreva notas e observações.”

(As versões editadas dos cadernos e diários de dos primeiros 36 anos de Twain como escritor possuem mais de 2.200 páginas.)

Deixe que a inspiração te leve ao conhecido e imaginário. Viaje. Observe as pessoas. Saia da sua zona de conforto e veja coisas e conheça pessoas que são “estranhas” e diferentes do que você está acostumado para torná-los conhecidos e depois compartilhe estes insights singulares com outras pessoas. Torne-se a pessoa mais interessante no ambiente porque você esteve lá e fez isso—e pode expressar isso em termos coloridos e animadores. (Apesar de mais dois preceitos de Twain devem ser ressaltados aqui: “Quanto ao adjetivo: quando na dúvida, retire-o.” e “Use uma linguagem simples, palavras curtas, e frases breves. Essa é a maneira de escrever em inglês—é a maneira moderna e a melhor maneira. Mantenha-se fiel a ela; não deixe os floreios e a verbosidade invadirem.” De que valem as melhores observações se ficarem perdidas embaixo da relva?)

No seu caderno de 1902-1903, Twain pode ter dado sua dica mais incisiva: “A hora de começar a escrever um artigo é quando você estiver satisfeito com o seu resultado. Nesse momento, você começa a perceber de maneira clara e lógica o que você realmente quer dizer.” Então, se vocês me dão licença, acho que preciso começar de novo o início…

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