William James escreveu que “A arte de ser sábio é a arte de saber o que deixar passar”.
Se isso for verdade, Steve Jobs pode ter sido um dos homens mais sábios do fim do século XX. Jobs pode não ter sido um “criador”, mas a sua noção de design toca quase todas as nossas vidas diárias—mesmo se você nunca usou um produto da Apple na sua vida. É difícil pensar em um produto lançado nas últimas décadas que não tenha copiado a estética da simplicidade de Jobs e da Apple.
No meio da década de 70, Jobs saiu da faculdade para viajar pela Índia. Enquanto se recuperava de uma disenteria, ele leu a autobiogfrafia do Iogue Paramahansa Yogananda, que iniciou uma fascinação pela religião oriental que duraria até o fim de sua vida. De acordo com seu amigo Larry Brilliant, “Steve estava flertando com a ideia de se tornar um sadhu”, que quer dizer um ascético que renunciava os bens mundanos.
Apesar disso parecer ser uma escolha de carreira um tanto estranha para alguém que acabou por chefiar uma das empresas de tecnologia mais penetrantes do mundo, esses interesses e essa mentalidade levaram a uma busca eterna por fazer com que as coisas sejam tão simples e óbvias no seu projeto e funcionamento que parecem quase intuitivas de serem usadas de cara.
1. Simplificar as coisas é mais do que fazer com que as coisas sejam fáceis
Esta simplicidade é a primeira lição que podemos aprender com ele. Simplicidade é mais do que tornar as coisas fáceis. Se fosse esse o caso, iPhones e Macs teriam botões de ligar/desligar. Simplicidade significa antecipar como um usuário perceberá um produto e como o produto fará sentido para as pessoas. Porém, o processo de pegar um produto ou uma ideia nos seus elementos mais básicos e necessários leva tempo. Em 1988, Jobs falou para a Business Week que “Este sempre foi um dos meus mantras—simplicidade. O simples pode ser mais difícil do que o complexo: Você precisa trabalhar muito para limpar o seu pensamento e torná-lo simples. Mas vale a pena no final das contas porque assim que você chega lá, é possível mover montanhas.”
As vidas das pessoas já são complicadas demais. Não queremos ler manuais de instrução sobre como usar um produto. Compramos esse produto, tiramos ele da caixa e queremos usá-lo imediatamente. Então convém a um designer ou a um escritor tirar um tempo para descobrir a mensagem que um produto ou conteúdo está transmitindo e como os clientes estão recebendo essa mensagem. Uma mensagem informativa não será lida se for muito complicada ou confusa. O telefone ou computador mais poderosos do mundo ficarão em uma mesa juntando poeira se for necessário uma graduação avançada para utilizá-los.
Porém, junto com esse pensamento deve vir a inovação. Pense na primeira vez que você viu ou usou um smartphone. A atração não era só sua facilidade de uso (um elástico é fácil de usar), é que ele era inovador. Era algo que as pessoas nunca tinham visto, mas mesmo assim, se apresentava de uma maneira que era ao mesmo tempo nova e intuitiva. “Mas é claro! Por que ninguém nunca havia pensado nisso antes?”
“VOCÊ NÃO PODE PERGUNTAR AOS CLIENTES O QUE ELES QUEREM E DEPOIS ENTREGAR A ELES. QUANDO VOCÊ CONSEGUIR CONSTRUIR O QUE ELES QUEREM, ELES JÁ VÃO QUERER ALGO NOVO.” —STEVE JOBS
2. Enriqueça Sua Vida Com Novas Experiências…e Pergunte
É fácil falar “seja inovador” (ou “Pense Diferente”, igual a famosa campanha de marketing da Apple), mas como é possível fazer isso? Infelizmente, apesar de não haver uma resposta única para essa questão, ter esse exato problema é na verdade um ponto forte de acordo a visão de Jobs. Em 1982, ao aceitar um prêmio da Academia de Realizações, ele disse: “Se você vai realizar conexões que são inovadoras…você não pode ter a mesma bagagem de experiência que todo mundo tem…caso contrário você vai fazer as mesmas conexões (que todo o resto), e aí você não será inovador, e ninguém vai te dar um prêmio.”
Jobs encorajou suas plateias e funcionários a aproveitarem suas características únicas e não fazer nem o que era esperado, nem o que o vizinho estava fazendo. No seu discurso na Academia, ele encorajou os ouvintes a tirarem um tempo para viajar, ver e experimentar coisas, ler, e ter novas experiências. Ele dizia: “Ouvi falar sobre um garoto que tem 14 anos e está indo pra Stanford, e isso é ótimo…mas talvez você queira pensar em ir para Paris e ser um poeta por alguns anos. Ou talvez você queira ir para um país de terceiro mundo. É muita coisa que vale a pena ser feita.”
Quanto mais experimentamos—e especialmente de maneira pessoal, não apenas pelo outro—não só nossas vidas serão mais ricas, mas também seremos mais bem treinados para perceber coisas novas. A experiência nos permite enxergar conexões entre coisas que outras pessoas podem não perceber. Mas mesmo se a exposição ao novo e desconhecido aumentar e aprofundar uma pessoa, a simplicidade não deve ser esquecida.
A questão mais simples de todas é “Por quê?” Crianças perguntam isso o tempo todo, não só porque elas não entendem como as coisas funcionam, mas também para transformar o desconhecido em conhecido, para fazer conexões entre o que sabem e o que não sabem. Se conseguirmos pensar como crianças, não de maneira infantil, mas arrancando nossos preconceitos e suposições sobre como as coisas são e como elas funcionam, podemos fazer novas conexões e inovações. Não devemos aceitar as coisas como são, mas perguntar como elas podem ser melhoradas.
Porém, fazer com que algo seja “mais simples” ou “melhor” nem sempre significa menos complicado. Às vezes, um recurso ou passo adicional pode fazer a diferença entre um pouco fora e exatamente no lugar certo. Existe uma piada famosa sobre Jobs e o primeiro iPhone. Ele estava quase pronto para ser produzido quando:
“Jobs segura o dispositivo em suas mãos…Ele pega o conector do fone e insere no iPod. Os engenheiros aguardam em um silêncio tenso. Algo está errado, e Jobs ainda nem apertou o play.
Ele tira o conector e insere de novo. E de novo. O pavor recai sobre o grupo. O lançamento está previsto para daqui a alguns dias. Jobs franze a testa e finalmente anuncia: “Onde está o clique?”
Os engenheiros exaustos respondem: “Clique? Como assim?”
“Estou dizendo que as pessoas precisam de um clique quando inserem o conector. Sem o clique elas não vão saber que o fone está colocado corretamente. Elas vão continuar a tentar e vão ficar preocupadas com o fone até quebrar. A solução não é elegante. Isso não é um pensamento de design.” Concluiu Jobs.
Quando uma pessoa consegue perceber estes “cliques” (ou falta deles) nas coisas, conexões e inovações podem ser feitas—mas só se alguém possui a consciência e experiência para percebê-los.
3. Criatividade é Só Conectar as Coisas
Em um post anterior sobre Mark Twain, notamos que Twain acreditava que não havia ideias originais. Ele dizia que “O núcleo, a alma—vamos além e dizer que a substância, o volume, a material verdadeiro e valioso de todas as iterações humanas—é plágio. … É necessário mil homens para inventar um telégrafo, ou um motor a vapor, ou um fonógrafo, ou um telefone ou qualquer outra coisa importante—e o último homem ganha o crédito e esquecemos dos outros. Pensando nisso, é quase que nossa incumbência nos expor ao máximo de conhecimento e inspiração que pudermos encontrar de qualquer fonte para sintetizá-la e, ironicamente, transformá-la em algo nosso.”
Jobs tinha a mesma mentalidade. Em 1995 ele falou a Wired Magazine: “Criatividade é uma questão de conectar as coisas. Quando você pergunta às pessoas criativas como foi que elas fizeram alguma coisa, elas se sentem um pouco culpadas porque não fizeram de fato, apenas enxergaram algo. Parecia óbvio para elas após um certo tempo. Isso é porque elas conseguiram conectar experiências que tiveram, e sintetizar coisas novas. E o motivo pelo qual conseguiram fazer isso foi porque tiveram mais experiências ou pensaram mais sobre suas experiências do que as outras pessoas.”
Muitas pessoas que não tiveram experiências muito diversas acabam com soluções lineares para os problemas justamente por não terem uma perspectiva mais ampla. Quanto mais ampla for a compreensão da experiência humana, melhores serão as inovações que teremos.
Na mesma entrevista, ele disse
“A Internet me lembra dos estágios iniciais da indústria de computadores. Ninguém sabia muita coisa. Não havia especialistas. Todos os especialistas estavam errados. Existe uma tremenda possibilidade aberta para tudo. E não foi confinada, ou definida de várias formas. Isso é maravilhoso. Existe uma frase no budismo que diz: “Mente de iniciante. É maravilhoso ter uma mente de iniciante.”
Jobs não era de forma alguma perfeito ou um modelo; notoriamente, ele podia ser terrível com as pessoas. Não devemos emular os processos de pensamento que traziam este comportamento ruim. Porém, seu compromisso com ser exposto ao máximo de experiências possíveis e olhar para as coisas de maneira não prejudicial para torná-las mais simples e/ou melhores são coisas que todos nós podemos fazer; só precisamos de paciência, observação, prática, e o compromisso para fazer o bom ser melhor e o melhor o mais perfeito possível.